“Um Pouco de Tempo”: Sabedoria, Ordem e Esperança Diante da Crise da Igreja

O texto abaixo é a transcrição de sermão proferido pelo Rev. Pe. Wander de Jesus Maia, na Associação Cultural Cor Mariae Dulcissimum (São Paulo/SP), em 11/05/2025, III Domingo da Páscoa.
Todos queriam saber o que significa “um pouco”. Em latim, modicum. Jesus nos fala de uma duração limitada, como nos ensina João 16,16:“Um pouco, e já não me vereis; e outra vez um pouco, e ver-me-eis, porque eu vou para o Pai”.
A Epístola de São Pedro reforça a ideia de atenção aos acontecimentos do mundo e submissão às autoridades. Ainda que isso nos custe, especialmente quando tais autoridades são corruptas, devemos lembrar:“Honrai a todos, amai os irmãos, temei a Deus, respeitai o rei” (1Pd 2,17).
Somos católicos ordeiros, não revolucionários. Toda autoridade vem de Deus (Rm 13,1). Mesmo quando o governo está nas mãos de figuras como Nero, os cristãos não deixaram de respeitar a ordem. Uma sociedade decadente, com aborto, crueldades e templos demoníacos, foi o cenário da primeira exortação apostólica à obediência.
É preciso tempo e paciência. A sabedoria costuma vir com a idade, mas quem guarda os mandamentos de Deus, como diz o Salmo 119,100, pode superar os anciãos em sabedoria:“Sou mais prudente do que os anciãos, porque guardo os vossos mandamentos” (Super senes intellexi, quia mandata tua servavi).
Guardar, meditar, viver os mandamentos confere uma sabedoria sobrenatural. Mas ela exige prudência: é preciso não se precipitar. Modicum é uma advertência à calma. O livro Imitação de Cristo lembra:“Do silêncio, raramente te arrependerás; das palavras, muitas vezes”.
Um exemplo de sabedoria precoce: São Leão Magno. Ele tornou-se Papa aos 40 anos e governou por 21. Foi o primeiro Papa chamado “Magno”. Em meio a heresias sobre a natureza de Cristo, escreveu a famosa carta a São Flaviano, Patriarca de Constantinopla. Nela, usou a expressão precisa: “uma pessoa em duas naturezas” (in duabus naturis), evitando os erros de dizer “de” ou “com”. Por isso, no Concílio de Calcedônia (451), disseram:“Pedro falou pela boca de Leão”.
Assim como São Basílio de Cesareia defendeu a conjunção “e” (et) na fórmula “Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo”, contra aqueles que diminuíam a divindade do Espírito Santo (cf. Mt 28,19), São Leão Magno usou uma preposição para defender a ortodoxia cristológica.
As soluções, às vezes, estão “na cara”, como os óculos que não percebemos estar usando. Requerem calma. Com essa sabedoria, Leão Magno enfrentou Atíla e salvou Roma sem guerra. Ele também introduziu no Cânon Romano a expressão sanctum sacrificium, immaculatam hostiam, enriquecendo a liturgia tradicional que se formava sob os Papas.
Exorto à paciência, sabedoria e prudência, sobretudo diante da atual crise da Igreja. Com a eleição de Leão XIV, devemos rezar, esperar, discernir. Às vezes, é mais prudente esperar um dia, um mês, um ano, antes de se pronunciar.
Fé, esperança e caridade: três virtudes teologais (cf. 1Cor 13,13). Não podemos permitir que a defesa ardorosa da fé esfrie nossa esperança ou caridade. Há risco de se tornar amargo, pessimista, frio. Quem vive em estado de graça possui caridade. Mas pode esfriar. A santidade está na vivência equilibrada das três virtudes.
Nossa Senhora é modelo perfeito delas. Maio, mês de Maria, é tempo de aprofundar uma tradição mariana familiar: o costume de rezar o terço em família aos sábados, por exemplo, pode formar futuras gerações de católicos piedosos.
Termino lembrando que o vinho e os bons licores ficam melhores com o tempo. Assim é a sabedoria, a prudência e a obra dos santos: São Tomás de Aquino morreu aos 50, Santo Agostinho e Santa Teresa também não viveram muito, mas suas obras são eternas.
Esperemos no Senhor. “Os que esperam no Senhor renovam suas forças” (Is 40,31). Quem espera em Deus não será decepcionado (cf. Sl 25,3).
Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós, que recorremos a vós!