Francisco e a Armadilha da Humildade Ostentada

Introdução
Desde o início de seu pontificado, Francisco adotou gestos exteriores de simplicidade de maneira deliberadamente pública, o que intensificou ainda mais a percepção de sua figura pessoal.
Essa publicidade foi interpretada por alguns como possível ênfase excessiva na figura pessoal de Jorge Mario Bergoglio, diminuindo o espaço para Cristo. Francisco Recusou tronos, roupas tradicionais, sapatos vermelhos, cruz de ouro, carro oficial, residência papal, dentre outras coisas. Esses gestos chamaram a atenção do mundo e, para muitos, foram vistos como sinais de humildade.
No entanto, olhando com mais atenção, percebemos um problema sério.
Um Culto à Personalidade
Esses gestos não se voltaram à dignidade do cargo que Francisco ocupou, mas à sua figura pessoal. As tradições da Igreja sempre distinguiram entre a pessoa do Papa e a dignidade do múnus petrino. Quando um Papa veste roupas solenes, usa insígnias ou recebe honras, não é por vaidade pessoal, mas para honrar o cargo que ocupa: o de Sucessor de Pedro, Vigário de Cristo.
Ao recusar sistematicamente os sinais exteriores de dignidade, Francisco não renunciou à própria importância pessoal, mas personalizou o papado, transformando tudo em torno de si mesmo. O cargo ele não recusou; a autoridade, também não; mas tudo o que simboliza a grandeza espiritual do ofício foi rejeitado, como se fosse indigno de sua distinta pessoa.
Essa tendência à diferenciação extrema ficou ainda mais evidente nas disposições de seu testamento, em que ele expressou o desejo de não ser enterrado nas Grutas Vaticanas — onde, tradicionalmente, repousam os papas, como sinal da continuidade apostólica —, mas na Basílica de Santa Maria Maior, num túmulo simples escavado no solo, com a inscrição “Franciscus”. Determinou também o uso dum caixão de madeira simples, com os custos pagos por um benfeitor anônimo.
Ou seja, até mesmo na morte, tudo precisou ser diferente, refletindo sua própria imagem e distanciando-se das tradições apostólicas que sustentaram e tornaram visível a sucessão de Pedro ao longo dos últimos dois mil anos.
Essas tradições não são meros costumes humanos, mas expressões visíveis duma realidade teológica: o prosseguimento da missão confiada por Cristo a Pedro e seus sucessores, reafirmando o mandato apostólico e edificando a fé dos fiéis.
Na prática, isso criou um “culto à humildade” que, inadvertidamente ou não, acabou se tornando um culto à personalidade, o que é incompatível com a verdadeira modéstia.
A Verdadeira Pobreza Evangélica
A pobreza evangélica, ensinada por Cristo, é antes de tudo pobreza de espírito: desapego interior, humildade profunda, abandono da própria vontade. Não consiste em gestos exteriores feitos para serem vistos pelos homens, mas numa transformação sincera do coração diante de Deus.
Como ensina São Tomás de Aquino na Suma Teológica, “a humildade consiste principalmente no ato da vontade”. Ou seja, a verdadeira humildade está no reconhecimento interior da própria pequenez diante de Deus, e na disposição sincera de submeter-se a Ele em tudo.
Em sendo assim, um homem pode viver num palácio e ser pobre de espírito, e também pode usar roupas simples e ser orgulhoso. O que importa é a disposição interior, e não o espetáculo exterior.
Quando a pobreza é alardeada, repetida e propagandeada, ela se torna, paradoxalmente, vaidade espiritual: o desejo de parecer humilde e de atrair atenção pela simplicidade aparente.
Conclusão
O problema não está nos gestos de simplicidade de Francisco em si mesmos, mas no uso repetitivo, ostensivo e midiatizado desses mesmos gestos, que colocaram sua figura pessoal acima da dignidade sagrada do cargo.
A verdadeira humildade não se exibe, mas se esconde. Como ensinava São Francisco de Sales, no Filoteia: “A verdadeira humildade não deseja ser conhecida ou reconhecida”. O Papa, como Vigário de Cristo, é servidor duma dignidade que o transcende, e que não lhe pertence pessoalmente.
É triste constatar que, numa época em que mais se precisava da grandeza do Papado, o que se construiu foi apenas a imagem duma “humildade” que falou muito de si mesma do que de Cristo. Mas confiamos na promessa do Senhor: “As portas do inferno não prevalecerão” (Mt 16,18). A grandeza da Igreja não depende dos homens, mas da fidelidade eterna de Deus, que nunca abandona sua Esposa.
A nós, cabe permanecer firmes na fé, confiantes de que, em todas as provações, Cristo é quem guia e sustenta sua Igreja até a consumação dos séculos.
Rezemos e trabalhemos para que possamos ser instrumentos fiéis dessa promessa, sob o amparo da Virgem Maria, Mãe da Igreja, confiantes em sua intercessão constante.