John Henry Newman: Contribuições e Cautelas

John Henry Newman é frequentemente citado na vivência da Igreja Católica, especialmente desde sua conversão do anglicanismo ao catolicismo em 1845. Recentemente canonizado pelo Papa Francisco, é reconhecido por muitos como um grande pensador. No entanto, cabe perguntar: quais são suas contribuições legítimas e onde é necessário cuidado?
Este artigo propõe uma análise respeitosa e prudente.
O que Newman ensinava?
Newman foi um homem inteligente, piedoso e sincero em sua busca pela verdade. Escreveu sobre teologia, doutrina e espiritualidade. Defendeu a autoridade da Igreja contra o protestantismo liberal e foi amplamente respeitado por sua honestidade intelectual.
Contudo, algumas de suas ideias levantam preocupações entre aqueles que desejam permanecer fiéis à doutrina tradicional da Igreja.
1. A teoria do “desenvolvimento do dogma”
Newman acreditava que os dogmas da Igreja podiam se desenvolver ao longo do tempo, como se amadurecessem organicamente. Essa ideia pode parecer inofensiva, mas foi usada por muitos modernistas para justificar mudanças profundas na doutrina católica, como se a verdade pudesse evoluir. Essa tese é apresentada em sua obra Essay on the Development of Christian Doctrine (1845).
O magistério tradicional, especialmente com São Pio X, sempre ensinou que a doutrina deve ser transmitida, não transformada. O que Cristo revelou, os apóstolos transmitiram e a Igreja conservou.
“Os dogmas da fé não devem ser considerados como fórmulas ocultas, que só poderiam ser entendidas por futuras gerações, mas devem ser entendidos no mesmo sentido que a Igreja sempre os compreendeu.”
— São Pio X, Pascendi Dominici Gregis, 1907
2. A “consciência” como guia supremo
Newman escreveu que a consciência era a voz de Deus no coração humano. Isso é verdadeiro em parte. No entanto, ele também afirmou que a consciência podia ter precedência sobre o Papa, o que pode ser interpretado como uma abertura ao subjetivismo moral.
“Certamente, se eu tiver de trazer a religião para uma tosta (um brinde), direi que brindarei à consciência primeiro, e depois ao Papa.”
— John Henry Newman, Letter to the Duke of Norfolk, 1875
Muitos teólogos modernistas abusaram dessa formulação para justificar decisões equivocadas em nome da “consciência pessoal”. O magistério tradicional, por sua vez, sempre ensinou que a consciência deve ser formada à luz da verdade objetiva e da doutrina infalível da Igreja (cf. Leão XIII, Libertas Praestantissimum, 1888).
3. Crítica à escolástica
Newman demonstrava reservas quanto à filosofia escolástica, especialmente à de São Tomás de Aquino. Preferia um estilo mais literário e histórico. Entretanto, a Igreja sempre recomendou com firmeza o estudo da teologia escolástica como fundamento sólido para a formação católica.
“A doutrina da Igreja Católica repousa sobre princípios claros e seguros que foram desenvolvidos, explicados e defendidos com sabedoria incomparável por Santo Tomás de Aquino, que a Igreja sempre propôs como mestre e guia para seus filhos.”
— Papa Leão XIII, Aeterni Patris, 1879
4. Influência no Concílio Vaticano II
Diversos documentos do Concílio Vaticano II citam ou se inspiram nas ideias de Newman. Seu pensamento influenciou a noção de “desenvolvimento” doutrinal e a teologia da consciência. Por isso, muitos tradicionalistas o encaram com reservas, considerando que o Concílio introduziu ambiguidades doutrinárias e pastorais.
Por exemplo, o documento Gaudium et Spes adota uma abordagem evolutiva da doutrina social da Igreja. Já Dignitatis Humanae trata da liberdade religiosa de forma incompatível com os ensinamentos firmes do magistério anterior (cf. Pio IX, Quanta Cura e o Syllabus Errorum, 1864).
Conclusão
John Henry Newman demonstrava profunda devoção à Igreja, reverência ao sagrado e zelo pela verdade. Sua conversão ao catolicismo foi corajosa. Além disso, combateu o racionalismo e o relativismo do seu tempo.
Ainda assim, suas ideias precisam ser lidas com discernimento. Embora respeitável em vários aspectos, não é uma referência totalmente segura para os católicos tradicionalistas. Ele não foi um herege, mas muitas de suas formulações ambíguas serviram de base para erros posteriores. Para manter-se firme na Tradição da Igreja, é preciso apoiar-se nos grandes doutores canonizados, no magistério infalível e nos santos que sempre defenderam a mesma fé, sem ambiguidades.
A leitura de Newman pode ser proveitosa, desde que feita com vigilância doutrinal, bem como tendo o Catecismo de São Pio X como guia seguro.