Fulton Sheen: Admiração Prudente, Distância Doutrinal

“A liturgia é a fé rezada; mudar a liturgia é mudar a fé.”
— Dom Marcel Lefebvre
Introdução
Fulton J. Sheen foi uma das figuras mais influentes da Igreja no século XX. Bispo norte-americano, orador brilhante, defensor da moral católica e pioneiro da evangelização pelos meios de comunicação, conquistou milhões com sua eloquência e carisma.
No entanto, sob a perspectiva tradicionalista, sua trajetória exige discernimento e distanciamento crítico.
1. Virtudes e Limites
Sheen era um homem de oração. Rezava diariamente diante do Santíssimo Sacramento, combatia o comunismo e o materialismo, e transmitia valores morais com clareza. Sua inteligência e habilidade comunicativa são inegáveis, e sua série televisiva Life is Worth Living marcou época. Muitas almas se converteram ou se aproximaram da fé por sua causa.
Contudo, sua espiritualidade era marcada por forte emocionalismo. Falava com frequência sobre o sofrimento, mas de forma psicologizante, voltada mais ao crescimento pessoal do que ao combate espiritual e à expiação objetiva pelos pecados.
Essa abordagem, embora inspiradora, é insuficiente para formar consciências doutrinariamente fortes.
2. Adesão ao Concílio Vaticano II
Sheen aderiu, sem resistência significativa, ao Concílio Vaticano II, e às reformas dele decorrentes, como a nova missa, o ecumenismo e a liberdade religiosa. Em entrevistas e escritos, chegou a dizer que o catolicismo se tornava mais “protestante”, e via nisso um avanço. Promoveu o diálogo inter-religioso e uma visão subjetivista da liberdade de consciência, em dissonância com o magistério tradicional.
Mais grave ainda foi seu total silêncio diante da perseguição a Dom Marcel Lefebvre e à Fraternidade Sacerdotal São Pio X. Quando a resistência tradicionalista se formava, Sheen preferiu o conformismo ao enfrentamento. Nunca reconheceu publicamente o valor dessa luta nem se solidarizou com os que defendiam a Missa de sempre.
3. Oposição por Contraste: Os Verdadeiros Resistentes
Enquanto Sheen se adaptava, outros se levantavam. Dom Lefebvre fundava seminários, denunciava os erros conciliares e defendia a Missa Tridentina. Pe. Roger-Thomas Calmel, dominicano, combatia com vigor o ecumenismo relativista e a reforma litúrgica. Dom Castro Mayer, no Brasil, mantinha a doutrina e a liturgia tradicionais sem concessões.
Esses são os autênnticos modelos para o católico tradicionalista: homens que defenderam a fé com clareza, coragem e fidelidade até o fim.
4. Um Perfil Ambíguo em Tempos de Crise
O estilo de Sheen, embora piedoso e eficaz para conversões iniciais, falhava na formação doutrinária profunda. Faltava-lhe firmeza contra os erros internos da Igreja. Jamais nomeou o modernismo como a heresia dominante que corroía os alicerces da doutrina. Enxergava os sintomas, mas evitava apontar as causas.
Sua adesão à Missa Nova foi pacífica, sem lamento ou resistência. Não denunciou as mutilações do rito nem os riscos doutrinários implicados. Sua compreensão da liturgia como expressão da fé (“lex orandi, lex credendi”) parecia superficial diante da gravidade do que ocorria.
Além disso, Sheen foi influenciado pelo pensamento personalista de Jacques Maritain, o que o levou a suavizar o rigor doutrinário em nome de uma interpretação humanista da dignidade da pessoa. Esse filtro comprometeu sua capacidade de transmitir a fé com a clareza que o momento exigia.
5. A Beatificação e o Risco de uma Canonização Simbólica
Seu processo de beatificação tem sido impulsionado por setores eclesiásticos ligados ao espírito conciliar. A elevação de Sheen aos altares, nesse contexto, corre o risco de canonizar, junto com sua pessoa, uma postura ambígua, conciliadora e adaptativa à crise.
Por isso, é necessário cautela. A santidade verdadeira também se mede pela firmeza doutrinária diante do erro.
Conclusão: Respeito, Mas Não Seguimento
Fulton Sheen foi um talento pastoral da Igreja pré-conciliar. Fez muito bem a muitas almas. Mas não se colocou ao lado dos que combateram com coragem a destruição interna da Igreja. Seu silêncio, suas concessões e sua adesão aos erros do Concílio o afastam do perfil de referência segura para os fiéis da Tradição.
O católico que deseja permanecer fiel ao depósito da fé pode admirar em Sheen algumas virtudes, mas não deve tomá-lo como modelo. Em tempos de confusão, não basta piedade: é preciso intransigência na verdade.
Que Deus o tenha em Sua misericórdia, e que os fiéis da Tradição jamais confundam prestígio com fidelidade.