As Veias de Deus: Meditação sobre a Cruz, o Sangue e a Escolha

O texto abaixo é a transcrição de sermão proferido pelo Rev. Pe. Wander de Jesus Maia, na Associação Cultural Cor Mariae Dulcissimum (São Paulo/SP), em 13/04/2025, Domingo de Ramos.
Caros fiéis, o fruto da consideração detida, detalhada em pormenores, da Paixão de nosso Divino Salvador, nos revela que, desde o início dos acontecimentos até o seu último suspiro, tudo se cumpre conforme as profecias, cada detalhe previsto pela Providência Santíssima, cada pormenor oferecido para a nossa santificação. E é da contemplação atenta desse mistério que podemos colher os mais santos frutos.
“Quem quiser vir após mim, tome sua cruz, negue a si mesmo e siga-me.”
Proclamamos a única e verdadeira religião: a fé católica, apostólica, romana, cujo centro é o mistério da Santíssima Trindade e o mistério da Encarnação da Segunda Pessoa Divina, que veio revelar o Pai e operar a justiça divina. Ele nos restituiu a Deus, nos tirou do poder do Maligno, oferecendo-nos como herança santa, limpa, purificada. Eis o mistério da Paixão: a obra da redenção operada por Nosso Senhor.
“Olhos não viram, ouvidos não ouviram…” É algo inacessível à mera razão natural. Tal compreensão não é dada a quem vive em pactos com a carne, com o mundo e com o pecado. Como contemplar o tamanho da batalha travada entre o Divino Salvador e toda a iniquidade desde a noite da Quinta-feira Santa até as 15h da Sexta-feira Santa, se ainda estamos divididos?
O salmista suplica: “Livra-me, Senhor, do combate”. E este combate não visa outra coisa senão roubar, matar e destruir. O inimigo quer que capitulemos, para que não alcancemos a herança eterna conquistada ao mais alto preço: o Preciosíssimo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, Segunda Pessoa da Trindade, feito homem no puríssimo seio da Virgem Maria. Seu Sangue tem poder infinito.
Este Sangue é renovado de modo incruento sobre nossos altares em cada Santo Sacrifício. Esta foi a paga. Este foi o preço.
“Dimas, olha para mim: está consumado”.
A redenção foi dada. A graça da compreensão, do reconhecimento da própria miséria, da condição de ovelha perdida, agora pode ser recebida. Toda a justiça superabundante está sendo consumada.
Ah, meus filhos, considerar a Paixão é começar a odiar o pecado e amar os santos. A cátedra onde os santos se formaram foi a Cruz do Senhor. Quando São Tomás terminou de escrever a Suma Teológica, a maior obra de doutrina da história da Igreja, diante do mistério da Cruz, recebeu sua última ciência infusa e declarou: “Tudo isto é palha”. Com toda reverência. E disse:
“Fui até onde pude, mas não esgotei. Agora, resta-me adorá-Lo”.
E o que recebeu por isso? Uma alma adorativa extraordinária. É o que deveríamos pedir.
Meus filhos, detenham-se nestes dias sobre os pormenores da Paixão. Rezem os Mistérios Dolorosos do Rosário, as 14 estações da Via-Sacra. Considerem: foi a malícia e a maldade infernal que explodiu Suas veias naquela noite de quinta-feira.
Quem morreu na Cruz foi Ele: Deus. Começaram a estourar as veias de Deus. Não foram as veias de um corpo, mas as veias do Verbo encarnado.
Ele chorou nossa iniquidade, nossa ingratidão, nossa impiedade. Suou sangue até formar argila com a terra vermelha. E nós? Enquanto estivermos indecisos entre a santidade e a impiedade, esqueçamos o mistério da Cruz.
Mas se, por graça divina, decidirmos agradar a Deus, qualquer contemplação da Paixão nos fará exclamar:
“Olha o que custei a Ele. Olha o que Lhe causei”.
Pare de ser omisso, meu filho. Pare de lavar as mãos. Pare de fingir que não é com você. Cada gota de sangue d’Ele caiu por tua culpa. Cada respiração trêmula é um “Tenho sede!” pela glória do Pai, pela tua alma, pela restituição da justiça.
Aquela multidão estéril e ensurdecedora não compreendia o que se passava. Mas Nosso Senhor sabia. Ele disse a Pedro:
“Você vai me dar amigos dolorosos, hein? Mas depois eu conserto”.
Deus não erra em Suas escolhas. Quem erra somos nós. Mas Ele nos escolheu. E se Ele não me der a graça, eu caio hoje mesmo. Mas se me der, eu permanecerei. E o momento chegará.
Mas como direi que sou d’Ele, se hoje não O amo, não creio, não obedeço? Esperarei o momento de um fuzil em minha cabeça para então proclamar minha fé? Não estarei forçando a Deus a um expediente extraordinário, por minha culpa?
É isso a que somos chamados a considerar nesta Semana Santa. A paixão do Senhor é a nossa escola, nosso espelho, nossa condenação e nossa esperança.
Transcrição fiel, adaptada e ajustada para leitura e meditação.