Confissão e Juízo: A Alma Diante de Deus

Juliano de Henrique Mello By Juliano de Henrique Mello 28 de março de 2025

O texto a seguir é uma catequese ministrada pelo Rev. Pe. Wander de Jesus Maia, na Associação Cultural Cor Mariae Dulcissimum, em São Paulo/SP, em 27/03/2025, quinta-feira da III Semana da Quaresma, sobre o Exame de Consciência e a Preparação para a Confissão.


1. Prólogo: a Tradição patrística e o combate às heresias

 

A doutrina dos santos padres da Igreja, como João Damasceno, último dos padres da era patrística, foi toda desenvolvida naquela época. O Concílio de Trento apenas reafirmou dogmaticamente, com autoridade infalível, aquilo que já estava presente na Tradição.

Hoje, há erros doutrinários, especialmente de sacerdotes sem formação. Veja-se, por exemplo, os que, por ignorância, acabam ensinando heresias, como a negação da união hipostática, confundindo as duas naturezas de Cristo como se fossem duas pessoas distintas. Os Concílios de Éfeso e Calcedônia já condenaram tais erros.

Não se pode interpretar dogmas com base em padres isolados ou pregações subjetivas. Até os maniqueus usaram Santo Agostinho de modo deturpado. Quem proclama erros cristológicos, com piedade aparente, mas sem formação, está fazendo grande mal às almas.

Vejamos o episódio do Papa São Celestino, que diante da heresia de Nestório, pede que São João Cassiano escreva em defesa da fé, e Cassiano o faz a pedido de ninguém menos que São Leão Magno. Este mesmo Leão proclamará dogmas fundamentais: a união hipostática e a comunicação de idiomas.

É severamente repreensível que um padre da nova religião negue a união hipostática e reduza Cristo a uma unidade moral das naturezas humana e divina, como se fosse uma cooperação entre duas pessoas.

Tal erro é mais que condenado pelos concílios, e já está sendo aproveitado pelos protestantes.

 

2. Introdução à catequese do dia, propriamente dita: nosso contexto quaresmal

 

Estamos agora na segunda metade da Quaresma. O próximo domingo será o Domingo Laetare. A catequese de hoje tem como tema o exame de consciência e o método para realizá-lo bem, a fim de colher os maiores frutos da confissão sacramental.

A validade da confissão depende de fatores importantes, mas principalmente da sinceridade e disposição do penitente. E mesmo quando não há invalidade, a frutificação pode ser severamente comprometida por uma má preparação.

 

3. Preparação espiritual para o exame de consciência

 

O exame de consciência deve começar com a preparação adequada: afastar toda distração, tomar a coisa a sério, considerando que da confissão pode depender a salvação. Deve-se fazer a confissão como se fosse a última da vida, invocando o Espírito Santo, a Santíssima Virgem, o Anjo da Guarda e os santos padroeiros.

É preciso ter consciência da gravidade do pecado. O pecado venial debilita a caridade; o pecado mortal destrói. Devemos lembrar que o pecado, mesmo venial, enfraquece a vida da graça, e o pecado mortal nos separa de Deus. O exame de consciência precisa ser feito com humildade, como uma criança caída que chora até que alguém a levante. Devemos rezar com insistência, como quem implora:

“Senhor, tem piedade de mim.”

Recordemos a importância de invocar os anjos. Eles foram designados por Deus para nos ajudar. Nosso anjo da guarda se espanta quando não recorremos ao seu auxílio. É ele quem avança à nossa frente, como no Êxodo, conduzindo-nos na travessia espiritual do pecado para a vida da graça.

 

4. Frequência e seriedade do sacramento da penitência

 

Após essa preparação interior, deve-se perguntar: Quando foi a minha última confissão? Onde e quando a fiz? Guardo essa data? Ela foi bem feita? Houve alguma confissão mal feita? Tenho certeza de que sempre me confessei bem ou duvido da validade de alguma?

Se houver dúvidas, devo procurar um confessor, pois ele, como juiz no tribunal da penitência, é quem julga em nome de Deus.

O confessionário é o tribunal onde se antecipa o juízo particular. O sacerdote deve confessar-se semanalmente. O fiel, ao menos quinzenalmente. Mais de um mês sem confissão é dar espaço para os demônios. Uma confissão bem feita exige sinceridade, dor pelos pecados, confissão clara e cumprimento da penitência. Se se esquecer algum pecado mortal, deve-se acusá-lo na próxima confissão. Mas o pecado mortal raramente é esquecido, pois ele marca a consciência.

Há um paralelo entre a vida sacramental e a medicina. Ninguém adia o socorro a um infartado ou a alguém com hemorragia. Da mesma forma, ninguém deveria adiar uma confissão quando percebe um pecado grave. Confissão não pode ser feita com pressa ou leviandade, mas também não pode ser desprezada. A negligência, neste campo, é gravíssima.

 

5. A ruptura com o pecado e o verdadeiro arrependimento

 

Insisto que uma alma verdadeiramente arrependida, ao sair do confessionário, rompe com o pecado. Dou o exemplo da jovem que, decidida, bloqueia o número do homem com quem vivia em pecado, e afirma:

“Hoje encontrei meu Salvador. Subi num sicômoro, e Ele me disse: ‘a salvação entrou hoje nesta casa’.”

A graça atual precede e prepara a graça sacramental:

“Onde abundou o pecado, superabundou a graça.”

 

6. Críticas pastorais e morais à formação e à sociedade

 

Critico a publicação indiscriminada da Teologia Moral de Santo Afonso ao público leigo. Ela foi escrita para confessores, e colocá-la nas mãos do laicato, sem a devida formação, pode causar confusão e presunção. A aplicação pastoral dos princípios morais cabe ao confessor, como guia prático no tribunal da consciência.

A crítica se estende também ao sistema de saúde e à atuação de médicos que se envolvem com práticas contrárias à fé. A indústria da fecundação artificial é uma das que mais cresce, e produz iniquidade em escala. Médicos que não despertam para a verdade católica andam pelo vale da morte.

 

7. Progresso na vida espiritual e consciência moral

 

A alma avançada na vida espiritual tende a não cometer pecados veniais de forma deliberada. Uma ira repentina, por exemplo, é imediatamente repudiada, sem que haja consentimento pleno. Mesmo assim, almas santas se confessavam com frequência extraordinária. Santo Afonso, nos últimos anos de vida, confessava-se duas vezes ao dia.

Menciono também a doutrina do equiprobabilismo moral. Um juiz, ao perceber que uma alma ainda é imatura e incapaz de compreender a gravidade de seus pecados, pode, por prudência, manter essa alma num estado intermediário, para não bloquear a próxima graça de conversão.

 

8. Sobre sacerdotes que negligenciam o altar e o confessionário

 

Muitos sacerdotes negligenciam, para não dizer abandonam, o altar e o confessionário, negando a celebração de missas e o atendimento de confissões. Comparo este abandono ao abandono do lar por um pai de família: ele desaparece de casa por uma semana e retorna dizendo “eu te amo”. A esposa, desesperada, obviamente não aceita esse amor, meramente verbal, que não se traduz em atos de presença e fidelidade.

Assim também Deus não aceita que o sacerdote negligencie seu ministério dizendo apenas que O ama.

 

9. Exame de consciência e deveres de estado

 

Sobre os exames de consciência prontos, os fiéis que se confessam com frequência podem dispensar o uso constante desses questionários. Mas, de tempos em tempos, é bom revisá-los. Para os que não têm esse hábito ou que fazem uma confissão geral, é útil seguir uma ordem: os dez mandamentos, os cinco mandamentos da Igreja e os deveres de estado. É importante também acusar as ocasiões próximas de pecado e reconhecer as negligências.

 

10. Exortação final

 

Por fim, exorto: se a confissão anterior foi feita com sinceridade e boa disposição, mesmo que houvesse algum erro ou esquecimento, ela não deve ser motivo de inquietação. Mas se houve má-fé, omissão ou descuido grave, deve-se reparar isso o quanto antes.

A alma que se prepara com zelo e se confessa frequentemente caminha seguramente na vida da graça.

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